image/svg+xml
Re
v.
Hipótese,
Bauru,
v.
8
,
esp. 1,
e02201
9
, 202
2
.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
1
LIVES MUSICAIS: O ARROUBO DO STREAMING EM TEMPO REAL DURANTE
A PANDEMIA DA COVID
-
19
LIVES MUSICALES: LA ATRACCIÓN DEL STREAMING EN EL TIEMPO REAL
DURANTE LA PANDEMIA DEL COVID
-
19
MUSICAL LIVES: THE STRIKE OF REAL TIME STREAMING
DURING THE COVID
-
19 PANDEMIC
Felipe Saldanha ODIER
Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG
)
e
-
mail:
mamutte.arte@gmail.com
Robert MOURA
Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG)
e
-
mail:
robertmoura@gmail.com
Lúcia Campos
Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG)
e
-
mail:
luciapcampos@gmail.com
Como referenciar este artigo
ODIER, F. S.; MOURA, R.; CAMPOS, L. Lives
Musicais: O arroubo do streaming em tempo
real durante a pandemia da Covid
-
19.
Revista Hipótese
, Bauru, v. 8, n. esp. 1, e022019, 2022.
e
-
ISSN: 1982
-
5587. DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
Submetido em
:
10/03/2022
Revisões
requeridas em
:
05/05/2022
Aprovado em
:
01/07/2022
Publicado em
:
01/12/2022
image/svg+xml
Lives musicais: O arroubo do streaming em tempo real durante a pandemia da Covid
-
19
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e022019
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
2
RESUMO
: Abordamos neste artigo a circulação e a escuta de música gravada e amplificada,
considerando também as experiências audiovisuais e a formação de público relacionadas às
performances musicais. Desde uma perspectiva etnomusicológica,
visamos
refletir sobre
o
advento das lives, fenômeno popularizado durante a pandemia da Covid
-
19. A partir dessa
prática de música ao vivo, em streaming em tempo real, observaremos seus efeitos sobre a
estética musical e a sociabilidade gerada entre os espectadores nos chats de
interativos durante
as performances, bem como das inco
e
rências de ordem econômica para os músicos nesse
formato. Observamos nesse modo de fruição a presença de redes de sociabilidade relacionadas
a conformações do gosto musical contemporâneo.
PALAVRAS
-
CHAVE
: Lives
musicais
. Música
popular
cantada.
Cena musical.
RESUMEN
: En este artículo abordaremos la circulación y escucha de música amplificada y
grabada, considerando sus experiencias audiovisuales y la formación de audiencias para estos
prod
uctos que tocan la imagen de las interpretaciones musicales a lo largo del tiempo. Desde
la perspectiva etnomusicológica, buscamos reflexionar sobre el advenimiento de las vidas,
fenómeno popularizado durante la pandemia del Covid
-
19. A partir de esta prác
tica de música
en vivo, en streaming en tiempo real, observaremos sus efectos sobre la estética musical y la
sociabilidad que se genera entre los espectadores en los chats interactivos durante las
actuaciones, así como las incursiones económicas para los m
úsicos en este formato. En este
modo de disfrute, observamos la presencia de redes de cooperación en estos contextos sociales,
lo que nos parece indicativo de conformaciones del gusto musical contemporáneo.
PALABRAS CLAVE
: Lives musicales. Canción.
Escen
a musical
.
ABSTRACT
:
In this article, we will address the circulation and listening of amplified and
recorded music,
considering the audiovisual experiences and audience formation related to
musical performances.
From the
ethnomusicological perspective, we seek to reflect on the
advent of lives streaming, a phenomenon popularized during the Covid
-
19 pandemic. From this
live music practice, in real
-
time streaming, we will observe its effects on musical aesthetics and
sociabi
lity generated among viewers in interactive chats during performances and economic
currencies for musicians in this format.
In this mode of fruition, we observe the presence of
sociability networks related to contemporary musical tastes.
KEYWORDS
: Musical
lives
. Popular
song
.
Musical
scene
.
image/svg+xml
Felipe Saldanha ODIER; Robert MOURA e Lúcia CAMPOS
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e02201
9
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://
doi.org/
10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
3
Introdução
Imagina
-
se algo muito distante para o ouvinte contemporâneo ter a música ao vivo como
principal fonte de experiência musical, como ocorria até as primeiras décadas do século XX,
quando começavam a se difundir e a se popularizar as primeiras formas de grava
ção e
reprodução sonora mecânica e elétrica. Antes disso, a música executada ao vivo era a única
forma de apreciação musical. Para uma pessoa ouvir música, ela mesma teria que tocá
-
la ou ir
ao encontro de quem a tocasse. Assim, excetuando as audições
-
execu
ções solitárias dos
musicistas ou de ouvintes valendo
-
se de fones de ouvido, a música é um importante fator de
socialização (leia
-
se socialização aqui como reunião na qual as pessoas compartilham a
experiência de escuta de música).
No entanto, a circulação
e escuta da música amplificada e
gravada promoveu uma nova experiência que viria a se tornar preponderante ao longo do século
XX
. Não obstante, o interesse do público pela música ao vivo se manteve. Mais recentemente,
o advento das
lives
musicais
, fenômen
o popularizado durante a pandemia da Covid
-
19
,
nos
levou a refletir sobre essas experiências.
As gravações surgiram com Thomas Edison em 1877
1
, que criou o fonógrafo de cilindro,
que permitia a gravação e a reprodução sonora em processo mecânico e obteve
êxito em sua
comercialização. O processo de venda de música gravada cresceria com a invenção do disco e
do gramofone por Emil Berliner. Após os primeiros discos de acetato, surgiriam, nos anos 1900,
os discos de 78 r.p.m. (rotações por minuto) de goma
-
laca
, e depois os discos de vinil (inventado
pelo húngaro Peter Carl Goldmark, nos anos 1940) em 45 r.p.m. e 33 r.p.m. Em meados dos
anos 1970, aparecem a fita cassete magnética e o cartucho (este último alcançou um grande
mercado nos EUA, mas a fita cassete c
onquistou um mercado maior em plano mundial, tendo
também maior longevidade)
(LEBRECHT, 2008, p. 101
-
102)
. O som digital do
compact disc
,
ou como é conhecido em sua forma abreviada CD, começou a ser desenvolvido pela Philips em
1969, mas só atingiu o merca
do no final dos anos 1970 e começou a ocupar o lugar do vinil na
preferência dos ouvintes nos anos 1980
2
.
Posteriormente, já na virada do milênio, vieram os formatos independentes de mídia
física como
WAV
ou
WAVE
(
Waveform Audio File Format
),
mp3
(
MPEG
-
1 Audio Layer 3
),
AAC
(
Advanced Audio Coding
),
WMA
(
Windows Media Audio
) ou
FLAC
(
Free Lossless Audio
Codec
), entre outros que se popularizam rapidamente, sendo também utilizados nas mais
1
“É comumente aceito que a gravação do som teve seu início em 1877, quando o inventor Thomas Alva Edison,
com voz esganiçada, entoou a canção infantil ‘
Mary had a little lamb’
num fonógrafo; e que alcançou o mercado
de massas pela primeira vez em 1902, com
o tenor Enrico Caruso [...]” (LEBRECHT,
2008
, p. 19
-
20).
2
Grove Dictionary.
image/svg+xml
Lives musicais: O arroubo do streaming em tempo real durante a pandemia da Covid
-
19
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e022019
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
4
recentes plataformas digitais de música como
Spotify
,
De
e
zer
,
G
oogle Play
,
YouTube Music
,
Apple Music
,
iTunes
ou
Tidal
para ficarmos em poucos exemplos das quase duas centenas
disponíveis.
No campo audiovisual, o grande público teve experiências com o VHS (
Video
Home System
) a partir dos anos 1970, e as inovações do s
éculo atual, DVD (
Digital Video Disc
)
e Blu
-
Ray (de qualidade superior ao DVD, o nome faz referência à cor “
blue
”, abreviado para
“
blu
” do raio ou “
ray
” emitido pelo aparelho durante a leitura e gravação dos dados no disco),
rapidamente ultrapassadas pelos
serviços de
streaming
3
.
Além desses meios de audição de música, as evoluções tecnológicas do século XX
proporcionaram aos ouvintes a possibilidade de ouvir música através das transmissões por rádio
e televisão. Umberto Eco considera que
o rádio e a televisão constituem um
meio
técnico
apto para transmitir sons ou
imagens à grande distância, e em segundo lugar (aspecto esse que foi alvo de
muitas discussões), um
meio artístico
que, como tal, promove a formação de
uma linguagem autônoma e abre novas possibilidade estéticas (
ECO
, 1
979, p.
315
,
g
rifos do autor).
Segundo Eco (1979, p. 316), “os meios audiovisuais nasceram e cresceram com o rádio
como meio de difusão”. Por volta dos anos 1920,
[...] um pesquisador da Westinghouse, Frank Conrad, com um transmissor que
construíra à gu
isa de passatempo numa garagem de Pittsburgh, começou a
transmitir, a título de experiência, notícias lidas dos jornais e música de disco.
Gradativamente se formou um público de radioamadores que acompanhava
aquelas transmissões ao acaso e começou a escrev
er
-
lhe, pedindo para ouvir
suas músicas preferidas. Em seguida, nas lojas de Pittsburgh, começaram a
aparecer aparelhos rádio receptores, apresentados como particularmente
adaptados “para ouvir a Westinghouse Station” (ECO
,
1979, p. 316).
Ainda de acordo
com Eco (1979, p. 316), “os ouvintes de Conrad não demonstravam
particulares inclinações estéticas: queriam apenas ouvir música em casa”. Assim, “o rádio pôs
à disposição de milhões de ouvintes um repertório musical ao qual, até bem pouco tempo, só se
podi
a ter acesso em determinadas ocasiões” (ECO
,
1979, p. 316). O próprio Umberto Eco (1979,
p. 318) ao questionar se o rádio, como instrumento de informação musical, teve efeitos positivos
ou negativos, acredita que para chegar a uma resposta é
necessário
exa
minar
fatores culturais,
sociológicos e econômicos. Em relação ao audiovisual, o autor observa que as exigências do
espetáculo na televisão (em se tratando da música popular) deram preferência aos “executantes
3
Descartarmos aqui formatos como fita de rolo, ADAT e Laser Disc, por eles não terem sido direcionados ou não
terem alcançado um consumo de massa.
image/svg+xml
Felipe Saldanha ODIER; Robert MOURA e Lúcia CAMPOS
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e02201
9
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://
doi.org/
10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
5
dotados de maior talento cênico, e a
imprescindível exigência de atualidade a que esse meio,
mais do que o radiofônico, está submetido” (ECO, 1979, p. 319).
Apesar de todos esses recursos para a audição de música gravada ou, a partir das
transmissões radiofônicas, televisivas e mais recentem
ente através da
internet
, as apresentações
musicais ao vivo nunca deixaram de estar no primeiro plano do público. A socialização,
que
surge
da interação das pessoas, a partir das audições coletivas de música ao vivo, independente
do ambiente, sejam elas re
uniões informais domésticas, pequenas ou grandes casas de shows,
estádios, salas de concerto, pode ajudar a explicar um pouco o fenômeno das
lives online
decorrente do isolamento social imposto pela pandemia da Covid
-
19. Disso, deriva a seguinte
questão: a
inda que o público possua em casa gravações em áudio e vídeo de alta qualidade (em
mídias físicas ou através de acessos
online
) e possam reproduzi
-
las em equipamentos
igualmente de alta definição, por que as
lives
foram tão bem recebidas?
4
Há de se observ
ar
,
ainda, que essa adesão às
lives
ocorreu apesar da baixa qualidade audiovisual em geral, sendo
inerentes à própria plataforma, como
o
caso do Instagram
,
que não fornece um bom suporte
para a realização das mesmas ou em razão de uma transmissão insuficie
nte. Até que ponto essa
audição
online
coletiva e a interação gerada através de compartilhamentos e comentários nos
chats
visam e conseguem reproduzir a sensação de conexão física ou mental com o outro?
Voltamos a Umberto Eco que, ao descrever a situação d
o ouvinte de rádio, destaca que:
Falta, portanto, ao ouvinte a ligação com o executante (solista ou conjunto
orquestral), a ligação que se concretiza naquele particular “magnetismo”, que
pode ser variamente definido, mas não ignorado; falta,
ademais, ao ouvinte a
ligação direta, física, com o grupo dos que escutam com ele. Ora, o
magnetismo do executante e o magnetismo do público são parte essencial de
uma audição musical tradicional, introduzindo na audição uma cota de
‘teatralidade’ que não
nega, mas caracteriza o rito musical (ECO, 1979, p.
319
-
320).
Considerando a qualidade de áudio e vídeo, há de se observar o despojamento, mesmo
de músicos famosos e com estrutura profissional, que realizaram
lives
em casa, muitas vezes
valendo
-
se apenas do som do celular, sem o recurso a equipamentos audiovisuais qu
e utilizam
em seus shows.
Além dos elementos relacionados à aparência e à
socialização, surge também
uma reflexão sobre a subsistência dos músicos que se viram impedidos de exercerem sua
atividade profissional devido ao isolamento e as possibilidades de re
muneração através da
monetização das
lives
e de editais de instituições culturais.
4
Como destacou, por exemplo
, o Portal Uai em sua retrospectiva do ano de 2020. Disponível em:
https://www.uai.com.br/app/noticia/musica/2020/12/22/noticias
-
musica,266318/retrospectiva
-
2020
-
lives
-
dominaram
-
o
-
ano
-
e
-
brasil
-
e
-
destaque
-
mundial.shtml
.
Acesso em: 03 mar
.
2022.
image/svg+xml
Lives musicais: O arroubo do streaming em tempo real durante a pandemia da Covid
-
19
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e022019
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
6
Os editais e a experiência do
streaming
em tempo real
Com o aumento
das
lives
,
as cenas musicais, fundamentalmente as formadas por artistas
independentes do
lowstream
5
, tomaram estas plataformas como intento de trabalhar
remuneradamente
por meio dessas “redes de cooperação” (BECKER, 2010)
–
sistema de
trabalho e fruição observado p
ela sociologia da arte sobre nichos e cenas musicais, por exemplo,
que são nomeados de “Mundos da Arte”
–
que se tornaram as
lives
musicais. Nesse sentido, as
instituições do poder público e privado se articularam em iniciativas que contemplassem a
circula
ção virtual dos profissionais das artes em geral, de forma mais expressiva por meio de
streamings
de audiovisual.
Os editais e chamamentos lançados pelas instituições culturais
6
em 2020, primeiro ano
da pandemia da Covid
-
19, entendem que as transmissões a
o vivo (o
streaming
em tempo real)
difundidas e popularizadas sob a nomeação de
live
, que implicavam em potenciais transtornos
de conexão de internet, com prejuízos principalmente na qualidade sonora das
performances.
Diante do dilema colocado, um simulacr
o de transmissões ao vivo é compactuado com a cena
artística, no sentido de que as apresentações seriam substituídas pela entrega do arquivo
audiovisual previamente gravado. Porém, seriam transmitidas em dia e hora marcada, pela
primeira vez, com o
chat
ao
vivo e a interação do público em tempo real, um modelo bem
comum, afinal estamos no “país da televisão”, que sempre negociou intercaladamente
programações gravadas e ao vivo.
No modelo em questão, o que interessa é a interação do público
–
o que interess
a é o
entretenimento do público
–
pois, concordamos com Guy Debord (1997, p. 16): “No mundo
realmente invertido
, a verdade é um instante do que é falso.” E, nesse engodo da presença,
produzida desde a sociedade contemporânea, compulsória ao
modus
dos algor
itmos das redes
sociais, em tempos reais descompassados, a sincronia se basta na experiência ao vivo da
narrativa ficcional criada para (entre)ter a audiência
de telespectador
, pois: “O espetáculo se
apresenta como uma enorme positividade, indiscutível e i
nacessível. Não diz nada além de ‘o
que aparece é bom, o que é bom aparece’. A atitude que, por princípio, ele exige é a da aceitação
passiva [...]” (DEBORD
,
1997, p. 16
-
17), uma passividade extremamente ativa em aceitar as
produções de presença em uma
sociedade do espetáculo,
mas chancelá
-
las por meio de suas
manifestações de aprovação e concordância com tudo aquilo que se apresenta no
espetáculo
.
5
Refere
-
se
ao nicho de mercado da música antagônico ao
mainstream
, o nicho
underground
(ou
lowstream
), de
artistas independentes, com pequeno ou médio alcance de público.
6
Alguns exemplos serão citados adiante, tomando
lives
musicais viabilizadas por meio de editais de iniciativas
público
-
privadas, na cidade de Belo Horizonte.
image/svg+xml
Felipe Saldanha ODIER; Robert MOURA e Lúcia CAMPOS
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e02201
9
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://
doi.org/
10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
7
Não nos referimos aqui ao espetáculo entendido como
performance
de um artista, mas o
espetáculo (espetacula
rização societária) que é, por exemplo, visto nas redes sociais, da imagem
fútil e futilizada do que se tornou
ser
artista nesse contexto líquido
7
das imagens “em crises de
narrativas” (NASCIMENTO, 2011), do contemporâneo. E os sons? Desde a perspectiva
e
tnomusicológica, levantamos a hipótese de que já não são mais escutados, o que parece
importar para o grande público das
lives
é a produção de presenças (virtuais) e narrativas
(durante as transmissões).
Conforme
as reflexões sociológicas de Antoine Hennio
n (2004
,
2002
, 2011
) sobre o
gosto musical, a partir de sua teoria dos
attachements
, vínculos ao objeto do gostar, o que
posicionaria aquele que gosta como um “amador” é prazer da fruição do que se escuta/se vê, na
emergência do gosto e do gostar. Segundo
o sociólogo francês:
A escuta não é só o instante, ela é também história. Sua reflexividade é
também sua capacidade em se construir como o âmbito de sua própria
atividade. Não mais, desta vez, no presente de um contato com sons que
passam, mas na duração
improvável de uma lenta invenção, aquela de uma
arte e de uma técnica da escuta pela escuta. Produção de espaços e de durações
próprias, de cenas e dispositivos “dedicados”, constituição progressiva e
evolutiva de um repertório, treinamento dos corpos e e
spíritos, formação de
um meio de profissionais, de um ofício de crítica e de um círculo de amadores,
é o outro viés de sua reflexividade: a música como delegação do poder de nos
emocionar a um conjunto de obras, que tornam
-
se alvo de uma escuta
privilegiad
a (HENNION, 2004, p. 17
-
18).
No entanto
, já não podemos mais
considerar apenas a
escuta e só ela, como objeto de
attachements
do público (amadores) que gosta de música, no contexto da pandemia e dos
acessos aos
streamings
em tempo real
,
que
privilegiam
mais a imagem e o instante de afeto da
performance
do artista, na transmissão audiovisual, do que o que se escuta no sentido forte da
produção sonora musical. Tudo isso também envolve a “escuta” de que fala Hennion, a
invenção de uma escuta.
Se
gundo Howard Becker (2010, p. 76), “O público familiariza
-
se com as novas
convenções através do contacto directo com a obra e, frequentemente, através das vivências
partilhadas com os outros em torno dessas obras. Ele vê e entende elementos inovadores nos
mais diversos tipos de contextos”, efeitos e significantes que são ensinados pelos artistas, ou
melhor, pelas cenas musicais. Essas produções de gosto pela moda que vem sendo publicizada,
pois no mercado da música, o que se consome é o que é veiculado em m
assa pelas curadorias e
produtoras que detém os “meios de produção”, para usar o discurso marxista no qual o
métier
7
BAUMAN, Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2001.
image/svg+xml
Lives musicais: O arroubo do streaming em tempo real durante a pandemia da Covid
-
19
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e022019
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
8
cultural tem fluência, leia
-
se também meios de comunicação ou ainda número de seguidores
em redes sociais e capital de publicidade paga (na
era do rádio e da TV, como principais
difusores do mercado música, nomeava
-
se esses “meios de produção” de “jabá”). É necessário
marcar, sobre a gestão da sociedade de classe, “[...] que
a burguesia é a única classe
revolucionária que sempre venceu
; ao mes
mo tempo, é a única para quem o desenvolvimento
da economia foi causa e consequência de seu domínio sobre a sociedade” (DEBORD, 1997, p.
57).
É nesse contexto que as
manifestações
sentimentais
surgem
sobre e sob a
performance
,
uma
timeline
de inscrições, e
scritas inocorrentes e recorrentes sobre a imagem (uma espécie de
palimpsesto que se sobrepõe na tela) e suas sonoridades que ali se apresenta nas transmissões.
Percepções verificáveis nos rastros que sobram para a posteridade, pois aquilo que se apresenta
sobra no arquivo morto e ressuscitável da imensa nuvem (acúmulos limbos
8
) virtual.
De um modo geral, os artistas exploram progressivamente as suas próprias
inovações e elaboram assim uma série de convenções peculiares ao seu
trabalho. (Muitas vezes, os
artistas colaboram no desenvolvimento de
inovações no seio de grupos, e as escolas ou as <<capelas>> artísticas que se
formam elaboram então convenções que lhes são próprias). Aqueles que
cooperam com os artistas, principalmente o público, fazem a aprendiz
agem
dessas convenções mais singulares e originais em contato com as obras
isoladas ou com um conjunto delas (BECKER, 2010, p. 76).
Com esse pacto que também possibilita aos artistas a escolha de como e quando registrar
suas
performances
, as instituições
contratantes também não se responsabilizam pela qualidade
das produções audiovisuais. As mesmas tampouco custeiam, além do valor do cachê, o ônus
para a realização da gravação e edição audiovisual
. O
utro seguimento do mercado da arte, que
fomenta a ausência da técnica do “espetáculo” (som, iluminação, cenotécnica, produção
executiva, etc), cuja morte dos bastidores nos parece ter sido imposta, pelos valores e propostas
de entrega do produto artístico
-
cultural por meio do vídeo.
De qualquer modo, a sobrevivência aqui é uma urgência, tanto no sentido financeiro por
parte dos artistas que necessitam dessa remuneração para arcarem com suas despesas mais
básicas
,
como alimentação, ou para a existência de seus “corpos utópicos”, como elucida
Tatiana Lima (2020) a partir de Michel Foucault, nas redes sociais, na cena musical e no tempo,
como artistas sobreviventes do apocalipse pandêmico dos sem palco. “O espetáculo
é o
capital
em tal grau de acumulação que se torna imagem” (DEBORD, 1997, p. 25), é sobre essa
8
Metáfora sobre a condição
da nuvem da internet, em referência ao fenômeno meteorológico
cumulonimbus
(cúmulo
-
nimbo), uma das maiores massas de nuvem em acumulações verticais com mais de quinze quilômetros
de altura.
image/svg+xml
Felipe Saldanha ODIER; Robert MOURA e Lúcia CAMPOS
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e02201
9
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://
doi.org/
10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
9
sobrevivência também que tocamos, além da subsistência do corpo que suporta a imagem e
suas
performances
.
Um breve panorama sobre
streamings
(
main, lown
e
liv
e
)
Para apresentar um panorama sobre como as
lives
movimentaram o cenário musical no
Brasil, selecionamos, no caso do
mainstream
, artistas de diferentes gêneros musicais que
aderiram ao formato e tiveram uma grande audiência: Roberto Carlos e Gilberto Gi
l, cantores
e compositores da MPB, originalmente ligados aos movimentos musicais dos anos 1960, Jovem
Guarda e Tropicália, respectivamente; o cantor e compositor Hyldon que surgiu nos anos 1970
associado a
soul music
; a cantora e compositora Adriana Calcan
hotto, também inserida na MPB,
mas com carreira oriunda dos anos 1990; Teresa Cristina, cantora com uma trajetória artística
marcada pelo samba a partir dos anos 2000; e surgida na década de 2010, a cantora e
compositora de sertanejo Marília Mendonça. Pinç
amos também a cantora lírica galesa
Katherine Jenkins a fim de obter uma inserção de música clássica entre as
lives
selecionadas e
o músico uruguaio Jorge Drexler por seu exemplo de uma abordagem diferente no tratamento
da
live
que realizou, buscando uma e
stética mais cinematográfica.
A cantora Teresa Cristina tornou
-
se um fenômeno realizando
lives
diárias no Instagram
9
com uma grande audiência, sendo coroada, simbolicamente, a “Rainha das
Lives”
(IZEL, 2020)
.
A artista fez de forma improvisada, usando apenas a sua voz
(e assim, continua, pois até o
momento em que esse artigo é escrito, ela segue realizando
lives
, apesar
de não ter mais a
regularidade diária), cantando à capela, e também abrindo espaço para a participação de outros
artistas interagirem no vídeo se apresentando também. Além de nomes famosos como Alcione
ou Gilberto Gil, Teresa Cristina também permitiu a ap
resentação de artistas desconhecidos do
grande público e que estavam ali a princípio como espectadores.
O cantor e compositor Hyldon que conquistou popularidade nos anos 1970, também se
dedicou à realização de
lives
diárias em seu perfil no Instagram
10
. N
o evento realizado a partir
de sua casa e batizado de
Live Improvisada
, o artista, além de cantar e se acompanhar ao violão,
contava história das canções, de sua carreira musical, entre outros assuntos que eram levantados
pelos espectadores através do
chat
. Hyldon ultrapassou o limite de cem
lives
. No perfil de
Hyldon constam 132
lives
, sendo que a última da lista foi realizada no dia 18 de fevereiro de
2021. Com uma audiência de proporção modesta durante a transmissão ao vivo, normalmente
9
Disponível em:
https://www.instagram.com/teresacristinaoficial/
.
Acesso em: 10 jan. 2022.
10
Disponível em: https://www.instagram.com/hyldon.oficial/
. Acesso em: 10 jan. 2022.
image/svg+xml
Lives musicais: O arroubo do streaming em tempo real durante a pandemia da Covid
-
19
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e022019
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
10
com uma média de
pouco mais de duas dezenas de pessoas, sendo que, entre elas,
aproximadamente metade compunha uma audiência regular
11
que
interagiu
entre si com as
live
s se tornando até mesmo um ponto de encontro. No entanto, as
lives
alcançavam algumas
centenas de visual
izações após a transmissão ao vivo, variando entre duzentas a oitocentas.
Algumas vezes durante suas
lives
, Hyldon citou como essa atividade
estava sendo boa para sua
saúde mental, um compromisso que ele firmou com o público para o qual ele reservava tempo,
inclusive, para preparar e ensaiar alguns números musicais, incluindo músicas que não eram de
seu repertório habitual. Ao mesmo tempo, mant
endo a ideia do improviso, o artista se arriscava
a tocar canções que eram pedidas na hora pelos espectadores, sem maiores preocupações
quando não conseguia lembrar algum acorde ou verso da letra.
A cantora e compositora sertaneja Marília Mendonça realizo
u sua primeira
live
12
em 8
de abril de 2020
,
na qual realizava a
performance
vocal ao vivo como em um
karaokê
no qual
o
playback
13
da banda é reproduzido em tempo real para a artista cantar, sentada em uma
poltrona na sala de sua casa. Com a transmissão de
imagem
ao
nível de produção televisiva,
com cortes de câmera e muitas interações entre um
set
e outro de canções, havia ainda o apelo
de mobilização de doações, por meio de
QR Code
exibida na tela da transmissão, para fins
filantrópicos em troca da aprese
ntação realizada de graça pela artista e oferecida ao seu público
fiel e cativo. “Os cantores nacionais dominaram o ranking global de lives musicais no YouTube,
divulgado pela plataforma. A artista em destaque é Marília Mendonça, que assumiu a liderança,
c
om 3,31 milhões de espectadores simultaneamente.” (WERNECK, 2020).
A presença da artista e a popularidade de suas composições são o que verdadeiramente
importam, afinal o
attachement
de seu público (amador) que a ama,
se
importa com a sua
apresentação ao v
ivo, independente se a performance instrumental de sua banda é gravada e
reproduzida como um
playback
.
A cantora lírica galesa Katherine Jenkins que se dedica ao repertório operístico, assim
como ao
pop
,
também realizou
lives
se valendo de
playback
em seu perfil no Facebook
14
.
Jenkins realizava toda uma
mise
-
en
-
scène
, mesmo estando em casa, não se descuidan
do dos
figurinos, sempre com vestidos longos. Considerando o universo da música clássica, no qual
ainda existem certas resistências à tecnologia como a amplificação elétrica/eletrônica de
11
Experiência vivenciada por um dos autores deste artigo.
12
Disponível em: https://youtu.be/s
-
aScZtOfbM
. Acesso em: 10 jan. 2022.
13
Base musica
l pré
-
gravada sobre a qual pode se cantar ou tocar um instrumento.
14
Disponível em: https://www.facebook.com/KJOfficial/live_videos
. Acesso em: 10 jan. 2022.
image/svg+xml
Felipe Saldanha ODIER; Robert MOURA e Lúcia CAMPOS
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e02201
9
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://
doi.org/
10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
11
instrumentos, percebe
-
se nesse caso, um abandono desse preciosismo m
usical em função de
uma necessidade. Algumas de suas
lives
alcançaram mais de meio milhão de visualizações.
Adriana Calcanhotto fez sua primeira
live
por meio da programação do SESC em Casa
15
que foi veiculado no canal do YouTube da instituição, em sua ca
sa, num ambiente de paredes
pretas, com duas redes cruzadas, uma azul sobre outra vermelha, sentada em um banquinho
tocando violão. O som nos parece captado por um microfone condensador, que envia à
audiência a sonorização da acústica da ambiência da sala
em que a artista realiza sua
performance
.
A preocupação
com a imagem,
de um modo mais amplo
, se preocupa menos com
a dimensão narcísica da presença de seu corpo diante da câmera, mas sim com a cena que se
instaura ao compor um cenário possível com elemento
s habitados em sua residência e que se
relacionam com seu trabalho anterior em curso até o início da pandemia.
A primeira
live
de Gilberto Gil e Família,
São João em Araras Ao Vivo,
foi
realizada no
quintal de sua casa, com a estrutura de um palco de
show e com captação, edição e transmissão
de imagem cuja qualidade se equipara a da produção de um e transmitida em seu canal do
YouTube
16
.
O evento manteve o padrão de um show de Gil, estritamente artístico, sem muitas
interrupções, no qual a música, a
pe
rformance
e o som importavam em primeiro plano naquele
acontecimento. A
live
junina de Gil, posteriormente, se tornou um EP
17
distribuído em todas
as plataformas de
streaming
de audição musical, por sua grandeza técnica de produção e de alto
nível (
mainstr
eaming
) de
performance
musical.
Conhecido por suas preocupações com qualidade técnica de seus shows e discos, fato
que o levou a partir dos anos 1970 a realizar suas gravações nos Estados Unidos da América
(ARAÚJO, 2014, p. 62), Roberto Carlos também se r
endeu às
lives
. No caso do artista, também
recai a produção televisiva, e aqui literalmente, pois a transmissão foi feita pela Rede Globo,
emissora com a qual o artista mantém um contrato de exclusividade. A
live
ocorrida no dia 19
de abril de 2020
18
, data
de seu aniversário de 79 anos, foi realizada em seu estúdio particular
Amigo
, situado no bairro da Urca, no Rio de Janeiro, que proporcionou a qualidade de som de
um estúdio profissional. Um diferencial
na
produção do cantor foi o fato de se apresentar
ac
ompanhado apenas por dois teclados executados por Tutuca Borba (músico de sua banda) e
15
Disponível em: https://youtu.be/y_rSFDWnxiQ
. Acesso em: 10 jan. 2022.
16
Disponível em: https://youtu.be/s6KB4dDmrcw
. Acesso em: 10 jan. 2022.
17
Sigla para
extended play
que correspondia ao disco de vinil, normalmente com quatro faixas, duas de cada lado
e que no Brasil tornou
-
se conhecido como compacto duplo em contraponto ao
compacto simples (ou
single
, em
inglês) que apresentava duas faixas, sendo uma de cada lado. As denominações EP e
single
tornaram
-
se habituais
no Brasil a partir do advento das plataformas digitais de música.
18
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=q5AI6p5id
-
I
. Acesso em: 10 jan. 2022.
image/svg+xml
Lives musicais: O arroubo do streaming em tempo real durante a pandemia da Covid
-
19
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e022019
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
12
Eduardo Lages (regente de sua banda). Normalmente, a RC
-
9 (como é batizada a banda de
Roberto Carlos) conta com quase duas dezenas de músicos. A formação reduzidíssima f
oi uma
forma de cuidado com as restrições imposta pelos protocolos da pandemia. Uma segunda
live
foi realizada pelo cantor em comemoração ao Dia das Mães, e mais uma vez o artista optou por
uma formação menor com apenas cinco músicos, Norival D’Angelo na b
ateria, Dárcio Ract no
contrabaixo, Paulinho Ferreira no violão e guitarra, e Tutuca Borba e Eduardo Lages nos
teclados. Vale observar que todos os músicos usaram máscaras, além de estarem separados uns
dos outros por placas de acrílico. Obviamente, cantan
do sem máscara, Roberto Carlos chamou
a atenção para o fato de que o distanciamento entre os músicos também estava sendo respeitado.
Os primeiros 45 minutos foram transmitidos pela Rede Globo, e em sua íntegra no canal de TV
a cabo, Multishow e na internet
no site Globoplay e no canal oficial do artista no YouTube.
Mas nem todas essas grandes produções se renderam à estética televisiva. Esse foi o
caso de
Jorge Drexler em concierto por Live Stream
, realizada em 5 de julho de 2020
19
, que se
deu como um
plano sequência em preto e branco, registrando desde a chegada do artista do
estacionamento do estúdio, que atravessa todo o percurso tocando uma caixinha de fósforo e
cantando a primeira canção do repertório, passando pelos bastidores, revelando a equipe
e
entregando seu chapéu e trocando a caixinha de fósforo por uma guitarra, com a qual segue até
o microfone e termina a canção. O músico cumprimenta o público telespectador e realiza todo
o seu show (que já estava em turnê antes da pandemia em formato solo
) contando com uma
estrutura performativa composta com elementos cênicos, movimentos de palco e iluminação
que criam ambiências
sofisticadas e uma contundente experiência imagética, mas
fundamentalmente sonora com texturas e
sound design
artístico. A
prese
nça do corpo no espaço
e em movimento com os objetos de cena e em relação às
intermidialidades
20
propostas em cena
como nos aspectos do “
tratamento da voz
”
, de acordo com Lívio Tragtenberg
(1999), que se
dá desde automações técnicas que contribuem com qualidades plásticas criadas pela expansão
da presença vocal ao vivo:
19
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=KnsFbj0Z
-
FI
. Acesso em: 10 jan.
2022.
20
“O termo “intermidia” foi introduzido por Dick Higgins no ensaio pioneiro “Intermedia”, em
Something Else
Newsletter
, v.1, n.1, 1966, publicado posteriormente em D. Higgins,
Horizons:
The Poetics and Theory of the
Intermedia, Carbondale: Southern
Illinois University Press, 1984, p. 18
-
28. Nesse Ensaio, Higgins anunciou sua
convicção de que “muito do melhor trabalho produzido atualmente parece cair entre mídias” (p.18). Sua maneira
de entender o termo tornou
-
se relevante para as tentativas de se dis
tinguirem as chamadas configurações
intermídias (
intermédia
) de configurações mixmídias (
mixed
-
media
) e multimídia (
multimedia
). Higgins usa
“intermedia” para se referir a obras “nas quais os materiais de várias formas de arte mais estabelecidas são
‘conce
itualmente fundidas’ em vez de simplesmente justapostas” (E. Vos, The Eternal Network: Mail Art,
Intermedia Semiotics, Interarts Studies, em U. B. Lagerroth, the Arts and Media, Amsterdam, Atlanta, Rodopi,
1997, p. 325); a qualidade da justaposição midiáti
ca é atribuída às chamadas configurações mixmídias e
multimídias.” (RAJEWSKY, 2012, p.
43)
.
image/svg+xml
Felipe Saldanha ODIER; Robert MOURA e Lúcia CAMPOS
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e02201
9
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://
doi.org/
10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
13
Combinada a recursos de amplificação e processamentos como alteração de
altura (
pitchchange
), timbre (alteração dos harmônicos, distorção,
compressão,
chorus
,
flange
, etc.), espacialidade, duração e ambientação
(reverberação curta, média ou longa, eco,
delay
, etc.), a voz no palco mais do
que nunca é um objeto de elaboração do compositor de cena
”
(TRAGTENBERG, 1999, p. 110).
Sob esse aspecto, no caso dessas produções de
mainstreaming
,
temos como um exemplo,
a
live
de Drexler
,
na qual podemos identificar aspectos cênicos/performativos, em que
“A
atenção do espectador se coloca na execução do gest
o, na criação da forma, na dissolução dos
signos e em sua reconstrução permanente. Uma estética da presença se instaura (
se
metenplace
)” (FÉRAL, 2008, p. 208). E nesse sentido forte da
performance
quando é arte, para
responder a questão de John Dewey (2010
) que pensa a “arte como experiência” e indaga a
experiência estética
(quando é arte?), em um tempo societário e cultural da banalização, da
liquidez e da descomplexificação das coisas e dos acontecimentos, é sempre bom lembrar que
ainda há arte:
Resumindo, diferentes grupos e subgrupos possuem em comum o
conhecimento das convenções em vigor numa disciplina artística e
adquiriram
-
na de diversos modos. Quando as circunstâncias o permitem ou
exigem, aqueles que partilham esse saber podem agir concert
adamente
segundo as modalidades inerentes à rede de cooperação em questão e, desse
modo, criar esse mundo da arte (da sua divisão interna em diversos tipos de
públicos, dos produtores e dos indivíduos que constituem o pessoal de apoio)
é outra maneira de f
alar da distribuição dos saberes e do seu papel da ação
coletiva (BECKER, 2010, p. 79)
.
Nesse sentido, a formação de
Mundos da Arte
é produzida pelo que é ensinado pelos
meios de produção, difusoras de estéticas, produtoras de gostos e gostares, os
attach
ements
(HENNION, 2004). O público é de certa forma induzido (ou ensinado) a gostar, a se vincular e
se apegar a determinado tipo de produção compulsória, televisiva, com padrões limitados de
comportamentos e modos de ser. A indústria produz amadores, mas e
m coexistência com
“mundos” que produzem experiências estéticas no sentido forte, como as de Jorge Drexler e
Adriana Calcanhotto, que cuidam de todos os aspectos da imagem, com a cena e
comportamento do corpo no espaço, seja no contexto do show como a
live
de Drexler, ou no
ambiente doméstico como foi o contexto da
live
de Calcanhotto. Aspecto que pode contribuir
para entendermos como opera o comportamento do público em relação aos produtos e
produções oferecidas pelas cenas musicais:
As práticas dos amado
res estudadas fazem variar de forma contrastante os
elementos de base do gosto, que a análise traz à tona: a relação com o objeto,
image/svg+xml
Lives musicais: O arroubo do streaming em tempo real durante a pandemia da Covid
-
19
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e022019
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
14
o apoio em um coletivo, o cultivo de si, enfim, a constituição de um
dispositivo técnico (entendido no sentido largo como um
conjunto mais ou
menos organizado de condições favoráveis ao desenrolar da atividade ou da
apreciação). O gosto não é nem o consequente (automático ou educado) dos
próprios objetos degustados, nem uma pura disposição social projetada sobre
os objetos ou si
mples pretexto de um jogo ritual e coletivo, ele é um
dispositivo reflexivo e instrumentalizado que coloca nossas produções à prova.
Ele não é mecânico, é sempre, “tentativa”, é um acontecimento (HENNION,
2004, p. 11).
A sociabilidade que atravessa o gost
ar e o amor dos amadores, em seus
attachements,
está implicada não só ao som da música, mas com as “redes de cooperação” (BECKER, 2010)
e de fruição, que se formam fundamentadas na degustação também do artista como objeto, na
socialização que se inscreve n
os
chats
das transmissões ao vivo, no entretenimento e na
produção de presença individual que contém o gesto da interação e da escrita durante as
lives
.
Há muitas possibilidades para o degustar dos amadores.
Sobrevivências possíveis e a
diversidade de produções profissionais em vídeo na Cena
Musical de Belo Horizonte
Para trazer um recorte das
lives
com artistas do
lowstreaming
, nos baseamos em artistas
da cena musical de Belo Horizonte (cidade na qual residem os autores do presente arti
go, sendo
os mesmos observadores participantes dessa cena como músicos e pesquisadores) que travaram
experiências com o formato das
lives
.
O projeto
Somos Um,
do músico Cliver Honorato, foi realizado como iniciativa
independente, desde a criação de “redes
de cooperação” e da associação do formato híbrido do
streaming
em tempo real, realizando duetos com convidados que enviavam suas participações
gravadas previamente, para serem reproduzidas em tempo real com a
performance
ao vivo de
Honorato, tocando violão
e cantando juntos com o artista convidado. A transmissão era
realizada com o apoio de um profissional técnico que captava o som da ambiência da sala do
apartamento do músico por meio de um gravador e o enviava
a
o monitor de retorno dos duetos,
que era esc
utado por um fone de ouvido de celular. Realizado de forma colaborativa com
artistas e produtores locais, interestaduais e internacionais, as “redes de cooperações” criavam
um engajamento que reunia diversos nichos de público e audiências diversas, contrib
uindo
inclusive para a abrangência e promoção do trabalho de Cliver Honorato, desde a veiculação
do
Somos Um
. Doações eram feitas pelo público por meio digital, de reais a euros, toda a equipe
envolvida era remunerada a partir do rateio do cachê arrecadado
pelo público durante o evento
virtual. Após a transmissão ao vivo a
live
permaneceu no canal do artista, no entanto
,
a sua
image/svg+xml
Felipe Saldanha ODIER; Robert MOURA e Lúcia CAMPOS
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e02201
9
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://
doi.org/
10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
15
primeira edição
21
saiu do ar, pois foi selecionada na Convocatória de Ocupação do Memorial
Minas Gerais Vale, cujo vídeo foi contratado e reexibido em segunda mão no canal da
instituição, permanecendo exclusivamente como publicação do mesmo, ou seja, a contratação
de uma
p
erformance
musical para compor a programação do espaço de 2021 se tornou um
acervo institucional.
O show inédito
Temperado
22
do artista Mamutte foi realizado em
site specific
mediante
a classificação e contratação por meio do primeiro edital
Convocatória
de Ocupação do
Memorial Minas Gerais Vale
de maneira virtual,
na
programação do espaço que ocorreu no
segundo semestre de 2020. Através de pesquisa de tecnologias possíveis para amenizar o
prejuízo sonoro de transmissão do instrumento e da voz concomitante
mente, foi utilizado um
mixer
23
,
inspirado no modelo da marca Roland, produto esgotado em todo mundo diante do
ineditismo pandêmico e da demanda por apresentações de
streaming
em tempo real. O tipo de
equipamento utilizado foi desenvolvido por diversos eng
enheiros de áudio independentes e
vendidos em vários modelos como
interfaces
para
streaming
de celular. Mamutte investe na
direção de arte como potência da imagem no plano videográfico, instaurando um cenário no
palco de seu quarto com uma composição de va
sos de plantas no espaço e iluminação cênica
de seu acervo técnico.
Cada música foi gravada individualmente e, então, reunidas na pós
-
produção. O artista apresenta para a tela plana um jogo do corpo em movimento diante da
câmera estática em apenas um plano
fixo e oferece uma qualidade sonora captada por meio de
linha desde a
interface/mixer
, cuidando com a dimensão sonora da
performance
musical.
A Universidade Federal de Minas Gerais também deu continuidade a sua programação
de eventos artísticos por meio do
Circuito Cultural UFMG #EmCasa
que repetiu a mesma
f
ó
rmula de transmissão empregada no Edital do Memorial Minas Gerais Vale, a de exibição em
tempo real de um registro audiovisual gravado previamente e estreado no YouTube em horário
e data marcada, como performatividade de ineditismo. Em destaque na programação, a cantora
Drag Queen
Azzula
24
apresenta
-
se acompanhada do músico André Resende em u
m vídeo
capturado em plano fixo e áudio que também registra bastante da ambiência do espaço da casa
em que realiza a
performance
. O “corpo utópico” e o
belting
25
como potência do
attachement
agrada ao seu público
,
se impondo sobre os aspectos sonoros e vis
uais do espaço e do vídeo em
21
Disponível em: https://youtu.be/X_cdNYESl
-
M
. Acesso em: 10 jan. 2022.
22
Disponível em: https://youtu.be/8xp4tEx3pkE
. Acesso em: 10 jan. 2022.
23
Streaming interfac
e for smartphone IS5 Gold Pro @ric_cortezgoldpro
24
Disponível em: https://youtu.be/9Vs6v9iBdQk
. Acesso em: 10 jan. 2022.
25
Ajuste vocal catalogado no contexto da música pop e gospel estadunidense, como técnica desenvolvida desde a
estética da língua
inglesa.
image/svg+xml
Lives musicais: O arroubo do streaming em tempo real durante a pandemia da Covid
-
19
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e022019
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
16
que se apresenta. O artista acaba ocupando um espaço de entretenimento ao se apresentar
realizando uma
performance
que perpassa também, além do musical tácito, a dimensão de uma
espécie de
entertainer
, pois afinal aquele vídeo previamente gravado deve ao público o
oferecimento de um frescor de como se fosse ao vivo, a simpatia, a emoção, o carisma, deve
(entre)ter. O ator que ali encarna a imagem e a forma de Azzula é um profissional da voz que
executa
com excelência e a exuberância o
punch belter
de seu canto, porém coexiste com a
coerência da figura e presença performativa da
Drag Queen
,
sendo
sempre associada à
ocupação de um lugar simbólico e performático de entretenimento, o que nesse contexto não
é
mais
que
uma especificidade atribuída ao artista em questão, mas a qualquer outro que ocupe a
presença de se apresentar em transmissões de “
lives”
com
streaming
em tempo de simulacro
do real, afinal a produção de presença deve ser a mesma (ficcionalizada
) pela fantasia interativa
nos
chats
, por parte do público, que deve esperar o mesmo do artista em sua
performance
.
A programação SESC
convida
, viabilizada por edital nacional, transmitiu o show
Instante
26
de Joana Bentes, pelo mesmo procedimento de regis
tro previamente gravado. Essa
estratégia minimizou os ruídos e quedas de conexão que estão sujeitos os
streamings
em tempo
real, principalmente as pequenas produções. Realizada em dois de dezembro de 2020, Bentes
,
produtora musical, artista visual e ilumin
adora, cuida sempre das imagens das cenas nas quais
se apresenta. O som captado em seu
home Studio JOB
foi cuidadosamente captado e mixado
pela própria artista, que figura na tela em variações de planos e cores na edição de vídeo.
Durante o show
,
a artista contou a história composicional de cada canção apresentada e deu um
tom narrativo especial a seu vídeo
-
show.
Considerações finais
Podemos considerar que parte dos espectadores que aderiram às
lives
, assim como os
ouvintes de rádio citados ant
eriormente por Eco (1979, p. 316), desejavam simplesmente ouvir
música.
Além disso, houveram aqueles que consideratam a necessidade de interação através
dos bate
-
papos durante as lives e, inclusive, a interação direta com o artista, como uma demanda
que em
ergiu devido ao isolamento social imposto pela pandemia
.
Diferentes abordagens técnicas e estéticas foram adotadas pelos músicos, de acordo com
possibilidades estruturais/econômicas ou por opção pessoal
,
em uma atitude de despojamento
artístico, leia
-
se p
or forma
-
força da
performance
para a tela plana. As experiências descritas
26
Disponível em: https://youtu.be/Ko8Dck4rlBE
. Acesso em: 10 jan. 2022.
image/svg+xml
Felipe Saldanha ODIER; Robert MOURA e Lúcia CAMPOS
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e02201
9
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://
doi.org/
10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
17
também apontam para o fator de que o público pode abrir mão de uma qualidade maior do
audiovisual desde que a produção musical (repertório e execução musical) o agrade. Pois,
segund
o
Anthony Seeger (2008), a música aqui é escutada mais pelo que toca como sinais de
recordação do coração humano do que como exigência de qualidade sonora ou de execução,
pois
“[...] para entender os efeitos da música sobre uma audiência é necessário enten
der de que
maneira as performances afetam tanto os
performers
quanto a audiência. De fato, música é mais
que física [...]” (SEEGER,
2008,
p. 244). Esses são a
spectos da sociabilidade musical que fazem
“[...] retraçar com os ouvintes os ‘costumes, reflexões e miríades de circunstâncias’ que dotam
a música de seus efeitos [...]” (SEEGER,
2008,
p. 244).
Nesse caso, há de se
considerar
tanto a percepção musical aud
itiva de cada um, como
diferentes qualidades de equipamentos reprodutores de músicas usados pelos ouvintes ao longo
da vida, nem sempre de muita fidelidade sonora.
A música é ouvida em diferentes formas
decadentes de qualidade sonora, a imagem tem mais for
ça, e ainda mais a presença marcada
nos afetos epistolares que estão inscritos nos chats em tempo real e são eternizados nos vídeos
na nuvem.
A
performance
se torna conteúdo e acervo de instituições por um valor irrisório. Os
direitos de uso de imagem e so
m são
obrigatórios e a perfeição
das apresentações toma uma
dimensão exaustiva na busca de um padrão de qualidade que supere a realidade errática e
exposta aos imprevistos e titubeios do
mundo
real da arte ao vivo. As apresentações viram
conteúdos, os show
s se tornam acervos, os cachês cada vez se reduzem a valores absurdamente
baixos e se submetem a inadmissíveis missões (impossíveis) de alimentar e custear toda uma
cadeia produtiva que trabalha a serviço do acontecimento da
performance
musical no tempo
real.
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, P. C.
O réu e o rei
:
Minha história com Roberto Carlos, em detalhes. 1. ed. São
Paulo: Companhia das Letras, 2014.
BECKER, H. S.
Mundos da Arte
. Tradução: Luís San Payo. Lisboa: Livros Horizonte, 2010.
DEBORD, G.
A Sociedade do Espetáculo
. Tradução: Estela dos Santos Abreu. Rio de
Janeiro: Contraponto, 1997.
ECO, U.
Apocalípticos e integrados
. 2. ed. São Paulo: Editora Perspectiva, 1979.
image/svg+xml
Lives musicais: O arroubo do streaming em tempo real durante a pandemia da Covid
-
19
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e022019
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
18
FÉRAL, J.
Por uma poética da performatividade: O teatro
performativo.
Revista Sala Preta
,
São Paulo, n. 8, p. 197
-
209, 2008. Disponível em:
https://www.revistas.usp.br/salapreta/article/view/57370. Acesso em: 18 set. 2022.
HENNION, A. Música e mediação:
Para uma nova Sociologia da Música.
Tradução:
Flavio
Barbeitas.
In
: CLAYTON, T.; HERBERT, R.
The Cultural Study of Music
: A Critical
Introduction.
London:
Routledge
, 2002.
HENNION, A.
Uma sociologia dos
attachements
:
De uma sociologia da cultura a uma
pragmática do gosto. Tradução: Lúcia Campos. 2004.
HENN
ION, A. Pragmática do Gosto
.
Desigualdade & Diversidade.
Revista de Ciências
Sociais da PUC
-
Rio
, Rio de Janeiro, n. 8, p. 253
-
277, jan./jul. 2011. Disponível em:
https://desigualdadediversidade.soc.puc
-
rio.br/media/artigo10_8.pdf. Acesso em: 20 fev.
2021.
IZEL, A.
Teresa Cristina, rainha das lives: ''O
que tem segurado a gente é a arte''.
Correio
Braziliense
, 2020. Disponível em:
https://www.correiobraziliense.com
.br/app/noticia/diversao
-
e
-
arte/2020/07/25/interna_diversao_arte,875107/teresa
-
cristina
-
rainha
-
das
-
lives
-
o
-
que
-
tem
-
segurado
-
a
-
gente
-
e
-
a
-
ar.shtml. Acesso em: 03 mar. 2022.
LEBRECHT, N.
Maestros, obras
-
primas & loucura:
A vida secreta e a morte vergonhosa
d
a indústria da música clássica. Trad
ução:
Rafael Sando. Rio de Janeiro: Record, 2008.
LIMA, T.
A
Canção nas lives
: Mediações da música pop em tempos de pandemia. TV
UFRB, 2020. 1 vídeo (61 min). Disponível em: https://youtu.be/x2eggmG1T9Q. Acesso em:
03 n
ov. 2021.
NASCIMENTO, J. P. C.
Abordagens do pós
-
moderno em música:
A incredulidade nas
metanarrativas e o saber musical contemporâneo.
São Paulo: Cultura Acadêmica, 2011.
RAJEWSKY, I. O.
Intermidialidade, intertextualidade e “remediação”:
Uma perspectiv
a
literária sobre a intermidialidade.
In
: DINIZ, T. F. N. (org.).
Intermidialidade e Estudos
Interartes:
Desafios da arte contemporânea. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2012.
SEEGER, A. Etnografia da Música.
Cadernos de campo
, São Paulo, v. 17, n. 17, p.
237
-
260,
2008. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/cadernosdecampo/article/view/47695.
Acesso em: 12 ago. 2022.
WERNECK, N. Retrospectiva 2020: Lives dominaram o ano, e Brasil é destaque mundial
.
UAI
, Belo Horizonte, 2020. Disponível em:
https://ww
w.uai.com.br/app/noticia/musica/2020/12/22/noticias
-
musica,266318/retrospectiva
-
2020
-
lives
-
dominaram
-
o
-
ano
-
e
-
brasil
-
e
-
destaque
-
mundial.shtml. Acesso em: 03 mar. 2022.
image/svg+xml
Felipe Saldanha ODIER; Robert MOURA e Lúcia CAMPOS
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e02201
9
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://
doi.org/
10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
19
SOBRE OS AUTORES
Felipe Saldanha ODIER
Universidade do Estado de Minas Gerais
(UEMG), Belo Horizonte
–
MG
–
Brasil. Mestrado
em Artes.
Robert MOURA
Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), Belo Horizonte
–
MG
–
Brasil. Mestrado
em Artes.
Lúcia CAMPOS
Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), Belo Horizonte
–
MG
–
Bras
il. Professora.
Doutorado em Etnomusicologia. École des Hautes Études em Sciences Sociales.
Processamento e edição: Editora Ibero
-
Americana de Educação.
Correção, formatação, normalização e tradução.
image/svg+xml
Re
v.
Hipótese,
Bauru,
v.
8
,
esp. 1,
e02201
9
, 202
2
.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
1
MUSICAL LIVES: THE STRIKE OF REAL TIME STREAMING DURING THE
COVID
-
19 PANDEMIC
LIVES MUSICAIS: O ARROUBO DO STREAMING EM TEMPO REAL DURANTE A
PANDEMIA DA COVID
-
19
LIVES MUSICALES: LA ATRACCIÓN DEL STREAMING EN EL TIEMPO REAL
DURANTE LA PANDEMIA DEL COVID
-
19
Felipe Saldanha ODIER
Minas Gerais State University
(UEMG
)
e
-
mail:
mamutte.arte@gmail.com
Robert MOURA
Minas Gerais State University
(UEMG)
e
-
mail:
robertmoura@gmail.com
Lúcia Campos
Minas Gerais State
University
(UEMG)
e
-
mail:
luciapcampos@gmail.com
How to refer to t
his article
ODIER, F. S.; MOURA, R.; CAMPOS, L.
Musical Lives: The strike of real time stream
ing
during the
Covid
-
19 pandemic.
Revista Hipótese
, Bauru, v. 8, n. esp. 1, e022019, 2022. e
-
ISSN: 1982
-
5587.
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
Submitted
:
10/03/2022
Revisions required
:
05/05/2022
Approved
:
01/07/2022
Published
:
01/12/2022
image/svg+xml
Musical Lives: The strike of real time streaming during the Covid
-
19 pandemic
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e022019
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
2
ABSTRACT
: In this article, we will address the circulation and listening of amplified and
recorded music, considering their audiovisual experiences and the formation of audiences for
these products that touch the image of musical performances over time. From the
e
thnomusicological perspective, we seek to reflect on the advent of lives streaming, a
phenomenon popularized during Covid
-
19 pandemic. From this practice of live music, in real
-
time streaming, we will observe its effects on musical aesthetics and sociabili
ty generated
among viewers in interactive chats during performances, as well as economic incurrencies for
musicians in this format. In this mode of enjoyment, we observe the presence of networks of
cooperation in these social contexts, which seems to us to
be indicative of conformations of
contemporary musical taste.
KEYWORDS
: Musical lives. Popular song.
Musical scene.
RESUMO
: Abordamos neste artigo a circulação e a escuta de música gravada e amplificada,
considerando também as experiências audiovisuais
e a formação de público relacionadas às
performances musicais. Desde uma perspectiva etnomusicológica, buscamos refletir sobre o
advento das lives, fenômeno popularizado durante a pandemia da Covid
-
19. A partir dessa
prática de música ao vivo, em streamin
g em tempo real, observaremos seus efeitos sobre a
estética musical e a sociabilidade gerada entre os espectadores nos chats de interativos durante
as performances, bem como das incorrências de ordem econômica para os músicos nesse
formato. Observamos ness
e modo de fruição a presença de redes de sociabilidade relacionadas
a conformações do gosto musical contemporâneo.
PALAVRAS
-
CHAVE
: Lives
musicais
. Música
popular cantada
.
Cena musical.
RESUMEN
: En este artículo abordaremos la circulación y escucha de música amplificada y
grabada, considerando sus experiencias audiovisuales y la formación de audiencias para estos
productos que tocan la imagen de las interpretaciones musicales a lo largo del tiem
po. Desde
la perspectiva etnomusicológica, buscamos reflexionar sobre el advenimiento de las vidas,
fenómeno popularizado durante la pandemia del Covid
-
19. A partir de esta práctica de música
en vivo, en streaming en tiempo real, observaremos sus efectos s
obre la estética musical y la
sociabilidad que se genera entre los espectadores en los chats interactivos durante las
actuaciones, así como las incursiones económicas para los músicos en este formato. En este
modo de disfrute, observamos la presencia de re
des de cooperación en estos contextos sociales,
lo que nos parece indicativo de conformaciones del gusto musical contemporáneo.
PALABRAS CLAVE
: Lives musicales. Canción.
Escena musical
.
image/svg+xml
Felipe Saldanha ODIER; Robert MOURA e Lúcia
CAMPOS
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e02201
9
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://
doi.org/
10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
3
Introduction
It is far away for the contemporary
listener to have live music as the main source of
musical experience, as was the case until the first decades of the 20th century when the first
forms of mechanical and electric sound recording and reproduction started to become widely
popular. Before then
, music performed live was the only form of musical appreciation. For a
person to hear music, he would have to play it himself or go to meet someone who played it.
Thus, except for the solitary listening performances of music players or listeners wearing
h
eadphones, music is an important factor in socialization (socialization here is understood as a
gathering in which people share the experience of listening to music). However, the circulation
and listening to amplified and recorded music promoted a new exp
erience that would become
prevalent throughout the 20th century. Nevertheless, the public's interest in live music has
remained. More recently, the advent of musical lives, a phenomenon popularized during the
Covid
-
19 pandemic, led us to reflect on these e
xperiences.
Recordings emerged with Thomas Edison in 1877
1
,
who created the cylinder
phonograph, which allowed sound recording and reproduction in a mechanical process and
succeeded in its commercialization. The process of selling recorded music would gro
w with the
invention of the record and the gramophone by Emil Berliner. After the first acetate records,
the 78 r.p.m. (revolutions per minute) gum records would appear in the 1900s, and then vinyl
records (invented by the Hungarian Peter Carl Goldmark in
the 1940s) in 45 r.p.m. and 33 r.p.m.
In the mid
-
1970s, the magnetic cassette tape and the cartridge appeared (the latter reached a
large market in the U.S., but the cassette tape conquered a larger market worldwide, also having
greater longevity) (LEBRECH
T, 2008, p. 101
-
102). The digital sound of the compact disc, or
as it is known in its abbreviated form CD, began to be developed by Philips in 1969 but only
reached the market in the late 1970s and began to take vinyl's place in listeners' preference in
th
e 1980s
2
.
Later, at the turn of the millennium, came the independent physical media formats such
as WAV or WAVE (Waveform Audio File Format), mp3 (MPEG
-
1 Audio Layer 3), AAC
(Advanced Audio Coding), WMA (Windows Media Audio) or FLAC (Free Lossless Audio
C
odec), among others that quickly became popular and are also used in the most recent digital
music platforms such as Spotify, Deezer, Google Play, YouTube Music, Apple Music, iTunes
1
“
It is commonly accepted that sound recording had its beginnings in 1877, when inventor Thomas Alva Edison,
in a squeaky voice, intoned the children's song 'Mary had a little lamb' into a
phonograph; and that it first reached
the mass market in 1902, with tenor Enrico Caruso [...]
”
(LEBRECHT, 2008, p. 19
-
20
, our translation
).
2
Grove Dictionary.
image/svg+xml
Musical Lives: The strike of real time streaming during the Covid
-
19 pandemic
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e022019
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
4
or Tidal to be a few examples of the almost two hundred available. In the
audiovisual field, the
general public had experience with VHS (Video Home System) from the 1970s. The
innovations of the current century, DVD (Digital Video Disc) and Blu
-
Ray (superior quality to
DVD, the name refers to the color
“
blue
”
, short for
“
blu
”
of
the ray emitted by the device during
the reading and recording of data on the disc), quickly surpassed by streaming services
3
.
In addition to these means of listening to music, the technological developments of the
20th century allowed listeners to listen to music through radio and television broadcasts.
Umberto Eco considers that
Radio and television constitute a technical medi
um that can transmit sounds
or images over long distances, and secondly (and this aspect has been the
subject of much discussion), an artistic medium that, as such, promotes the
formation of an autonomous language and opens up new aesthetic possibilities
(
ECO, 1979, p. 315, emphasis added
, our translation
).
According to Eco (1979, p. 316
, our translation
),
“
the audiovisual media were born and
grew up with radio as a broadcasting medium
”
. Around the 1920s
,
[...] a Westinghouse researcher, Frank Conrad, with a transmitter he had built
as a hobby in a Pittsburgh garage, began transmitting, as an experiment, news
read from newspapers and recorded music. Gradually, an audience of radio
amateurs who randomly foll
owed these broadcasts began writing to him,
asking to hear his favorite music. Then, in Pittsburgh stores, radio receivers
began to appear, presented as particularly adapted
“
for listening to
Westinghouse Station
”
(ECO, 1979, p. 316
, our translation
).
Still, according to Eco (1979, p. 316
, our translation
), "Conrad's listeners showed no
particular aesthetic inclinations: they just wanted to listen to music at home". Thus, "radio made
available to millions of listeners a musical repertoire that,
until recently, could only be accessed
on certain occasions" (ECO, 1979, p. 316
, our translation
). Umberto Eco himself (1979, p. 318),
when questioning whether radio, as an instrument of musical information, has had positive or
negative effects, believes t
hat to get an answer, it is necessary to examine cultural, sociological,
and economic factors. About the audiovisual, the author observes that the demands of the
spectacle on television (when it comes to popular music) have given preference to "performers
endowed with greater stage talent, and the indispensable requirement of timeliness to which
this medium, more than the radio medium, is subjected" (ECO, 1979, p. 319
, our translation
).
3
We rule out formats such as roll tape, ADAT, and Laser Disc here because they have not been
targeted or reached
mass consumption.
image/svg+xml
Felipe Saldanha ODIER; Robert MOURA e Lúcia
CAMPOS
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e02201
9
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://
doi.org/
10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
5
Despite all these resources for listening to recorded music or from ra
dio and television
broadcasts and, more recently, through the Internet, live music performances have always
remained in the foreground of the public. Socialization, the fruit of people's interaction from
the collective auditions of live music, regardless o
f the environment, be they informal domestic
gatherings, small or large concert halls, stadiums, or concert halls, may help explain a little the
phenomenon of online lives arising from the social isolation imposed by the Covid
-
19 pandemic.
From this, the f
ollowing question arises: even if the public has high
-
quality audio and video
recordings at home (on physical media or through online access) and can play them back on
high
-
definition equipment, why have lives been so well received?
4
It should also be not
ed that
this adhesion to lives occurred despite the low audiovisual quality in general, being inherent to
the platform itself, as is the case of Instagram, which does not provide good support for the
realization of lives or due to insufficient transmission
. To what extent do this collective online
listening and the interaction generated through sharing and commenting in the chats aim and
succeed in reproducing the feeling of physical or mental connection with the other? Finally, we
return to Umberto Eco, wh
o, when describing the situation of the radio listener, points out that:
The listener lacks, therefore, the connection with the performer (soloist or
orchestral ensemble), the connection that is concretized in that particular
"magnetism", which can be va
riously defined, but not ignored; the listener
also lacks the direct, physical connection with the group of those who listen
with him. Now, the performer's magnetism and the audience's magnetism are
an essential part of a traditional musical audition, intr
oducing a quota of
"theatricality" that does not deny but characterizes the musical rite (ECO,
1979, p. 319
-
320
, our translation
)
.
Considering the quality of audio and video, it is worth noting the stripping, even of
famous musicians with
professional structure, who performed lives at home, often using only
the sound of the cell phone, without the use of audiovisual equipment that they use in their
concerts. Beyond the aesthetic and socialization aspects, there is also a reflection on the
s
ubsistence of musicians who were prevented from exercising their professional activity due to
isolation and the possibilities of remuneration through the monetization of their lives and
cultural institutions.
4
Como destacou, por exemplo, o Portal Uai em sua retrospectiva do ano de 2020. Disponível em:
https://www.uai.com.br/app/noticia/musica/2020/12/22/noticias
-
musica,266318/retrospectiva
-
2020
-
lives
-
dominaram
-
o
-
ano
-
e
-
brasil
-
e
-
destaque
-
mundial.shtml
.
Acesso em: 03 mar 2022.
image/svg+xml
Musical Lives: The strike of real time streaming during the Covid
-
19 pandemic
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e022019
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
6
The edicts and the experience of streaming in
real time
Facing the rush of lives, the music scenes, mainly formed by independent artists from
the low stream
5
,
took these platforms as an attempt to work in a paid way through these
“
cooperation networks
”
(BECKER, 2010)
-
a system of work and fruition observed by the
sociology of art on niches and music scenes, for example, which are named
“
Worlds of Art
”
-
that be
came the music lives. In this sense, public and private institutions have articulated
themselves in initiatives that contemplate the virtual circulation of arts professionals in a more
expressive way through audiovisual streamings.
The edicts and calls lau
nched by cultural institutions
6
in 2020, the first year of the
Covid
-
19 pandemic, understood that the live transmissions (real
-
time streaming) disseminated
and popularized under the name of live, which implied potential internet connection disruptions,
wi
th losses mainly in the sound quality of the performances. Facing this dilemma, a simulacrum
of live transmissions is agreed upon with the artistic scene in the sense that the presentations
would be replaced by the delivery of the audiovisual file previous
ly recorded. However, they
would be broadcasted on an appointed day and time, for the first time, with live chat and real
-
time audience interaction, a very common model. After all, we are in the
“
country of television
”
,
which has always negotiated recorded
and live programming interchangeably.
In the model in question, what matters is audience interaction
-
what matters is audience
entertainment
-
because we agree with Guy Debord (1997, p. 16
, our translation
):
“
In the
inverted world, truth is an
instant of what is false
”.
And, in this lure of presence, produced by
contemporary society, compulsory to the modus of social media algorithms, in
uncompassionate real
-
time, synchronicity is enough in the live experience of the fictional
narrative created
to (between)have the viewer audience because:
“
The spectacle presents itself
as an enormous positivity, indisputable and inaccessible. It says nothing but 'what appears is
good, what is good appears.' The attitude that it demands on principle is passive ac
ceptance [...]
”
(DEBORD, 1997, p. 16
-
17
, our translation
), an extremely active passivity in accepting the
productions of presence in a society of the spectacle, but sanctioning them through their
manifestations of approval and agreement with everything tha
t is presented in the spectacle.
We are not referring here to the spectacle understood as an artist's performance, but the
spectacle (societal spectacularization) that is, for example, seen in social networks of the futile
5
Refers to the niche of the music market that is antagonistic to the
mainstream, the underground (or low stream)
niche, of independent artists with a small or medium audience reach.
6
Some examples will be cited below, taking musical lives made possible through public
-
private initiatives in Belo
Horizonte
.
image/svg+xml
Felipe Saldanha ODIER; Robert MOURA e Lúcia
CAMPOS
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e02201
9
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://
doi.org/
10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
7
image of what it has become to be
an artist in this liquid
7
context of images
“
in crises of
narratives
”
(NASCIMENTO, 2011), of the contemporary. And the sounds? From the
ethnomusicological perspective, we hypothesize that they are no longer listened to, what seems
to matter to us for the
great public of lives is the production of (virtual) presences and narratives
(during the broadcasts).
According to the sociological reflections of Antoine Hennion (2004, 2002, 2011) about
musical taste, based on his theory of attachments, links to the ob
ject of liking, what would
position the one who likes as an
“
amateur
”
is the pleasure of fruition of what is heard/seen, in
the emergence of taste and liking. According to the French sociologist
:
Listening is not only instant, it is also history. Its reflexivity is also its capacity
to construct itself as the sphere of its activity. No longer, this time, in the
presence of contact with passing sounds, but in the improbable duration of a
slow invent
ion, that of an art and a technique of listening through listening.
The production of spaces and durations of its own, of "dedicated" scenes and
devices, the progressive and evolutionary constitution of a repertoire, the
training of bodies and spirits, the
formation of a professional milieu, of an
office of criticism and a circle of amateurs, is the other side of its reflexivity:
music as the delegation of the power to move us to a set of works, which
become the target of a privileged listening (HENNION, 20
04, p. 17
-
18
, our
translation
)
.
However, we can no longer take listening and only it as the object of attachment of the
public (of amateurs) who like music in the context of pandering and the raptures of real
-
time
streamings in which the image and the ins
tant of affection of the artist's performance, in the
audiovisual transmission, are privileged more than what is listened to in the strong sense of
musical sound production. All this also involves the
“
listening
”
that Hennion talks about, the
invention of
listening
.
According to Howard Becker (2010, p. 76
, our translation
),
“
Audiences become familiar
with new conventions through direct contact with the work and often through shared
experiences with others around those works. He sees and
understands novel elements in many
different contexts,
”
effects and signifiers that the artists teach, or the music scenes. These
productions of taste for fashion that has been publicized because, in the music market, what is
consumed is what is massively
broadcasted by the curators and producers who own the
“
means
of production
”
, to use the Marxist discourse in which the cultural métier has fluency, also read
media or even number of followers on social networks and paid advertising capital (in the era
of r
adio and TV, as the main diffusers of the music market, these
“
means of production
”
were
7
BAUMAN, Z. Liqu
id modernity. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2001.
image/svg+xml
Musical Lives: The strike of real time streaming during the Covid
-
19 pandemic
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e022019
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
8
called
“
jabá
”
). It is necessary to mark, about the management of class society,
“
[...] that the
bourgeoisie is the only revolutionary class that has always won; at the
same time, it is the only
one for whom the development of the economy was both cause and consequence of its
domination over society
”
(DEBORD, 1997, p. 57
, our translation
).
In this context, the sentimental strengths emerge on and under the performance, a
timeline of inscriptions, recurrent and innocent writings on the image (a kind of palimpsest
superimposed on the screen), and its presented sounds here in the transmissions.
Verifiable
perceptions in the traces that remain for posterity, for what is presented remains in the dead and
resuscitable archive of the immense virtual cloud (limbo
8
accumulations
)
.
In general, artists progressively explore their innovations and
thus elaborate a
series of conventions peculiar to their work. (Often, artists cooperate in the
development of innovations within groups, and the schools or the <<chapel>>
artistic ones that are formed then elaborate conventions peculiar to them.)
Those wh
o cooperate with the artists, especially the public, make learning
these more unique and original conventions in contact with the isolated works
or a set of them (BECKER, 2010, p. 76
, our translation
).
With this pact that allows artists to choose how and
when to record their performances,
the contracting institutions are also not responsible for the quality of audiovisual productions.
They also do not pay, in addition to the value of the fee, the cost of recording and audiovisual
editing, another segment o
f the art market, which fosters the absence of
“
show
”
techniques
(sound, lighting, scenery, executive production, etc.), whose death of the backstage seems to
have been imposed on us by the values and proposals of delivery of the artistic
-
cultural product
through video
.
In any case, survival here is urgent, both in the financial sense on the part of the artists
who need this remuneration to pay for their most basic expenses, such as food, or the existence
of their
“
utopian bodies
”
, as Tatiana Lima (2020) el
ucidates from Michel Foucault, in social
networks, in the music scene, and in time, as surviving artists of the pandemic apocalypse of
those without a stage.
“
The spectacle is the capital in such a degree of accumulation that it
becomes image
”
(DEBORD, 199
7, p. 25
, our translation
), it is about this survival also that we
touch, beyond the subsistence of the body that supports the image and its performances
.
8
A metaphor about the condition of the internet cloud, about the meteorological phenomenon cumulonimbus
(cumulus
-
nimbo), one of the largest cloud masses in vertical accumulations over fifteen kilometers h
igh
.
image/svg+xml
Felipe Saldanha ODIER; Robert MOURA e Lúcia
CAMPOS
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e02201
9
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://
doi.org/
10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
9
A brief overview of streams (main, lown, and live)
To present an overview of how lives have moved the music scene in Brazil, we selected,
in the case of the mainstream, artists from different musical genres who adhered to the format
and had a large audience: Roberto Carlos and Gilberto Gil, singers and son
gwriters from MPB,
originally linked to the musical movements of the 1960s, Jovem Guarda and Tropicália,
respectively; the singer and songwriter Hyldon who emerged in the 1970s associated with soul
music; The singer and songwriter Adriana Calcanhotto, also
part of the MPB, but with a career
originating in the 1990s; Teresa Cristina, a singer with an artistic trajectory marked by samba
from the 2000s; and, appearing in the 2010s, the singer and songwriter of sertanejo (country
music) Marília Mendonça. We als
o selected the Welsh lyrical singer Katherine Jenkins to obtain
insertion of classical music among the selected lives, and the Uruguayan musician Jorge Drexler
for his example of a different approach in the treatment of the live he performed, seeking a mor
e
cinematographic aesthetic
.
The singer Teresa Cristina became a phenomenon performing daily lives on Instagram
9
with a large audience, being crowned, symbolically, the
“
Queen of Lives
”
(IZEL, 2020).
Performed in an improvised way, the artist relied only on her voice (and so, she continues,
because, until the moment this article is written, she continues performing lives, although no
longer with daily regularity), singing a cappella, and
also opening space for the participation of
other artists to interact in the video performing as well. Besides famous names such as Alcione
or Gilberto Gil, Teresa Cristina also allowed the presentation of artists unknown to the general
public, who were t
here at first as spectators.
T
he singer and songwriter Hyldon, who gained popularity in the 1970s, has also
dedicated himself to conducting daily lives on his Instagram
10
profile. In the event held from
his home and named Improvised Live, the artist, in a
ddition to singing and accompanying
himself on guitar, told the story of songs, and his musical career, among other issues that
viewers raised through the chat. Hyldon has exceeded the limit of 100 lives. Hyldon's profile
contains 132 lives; the last one o
n the list was held on February 18, 2021. With an audience of
modest proportions during the live broadcast, usually with an average of just over two dozen
people, and among them, approximately half made up a regular
11
audience that began to
interact with e
ach other, with the lives becoming even a meeting point. However, the lives
9
Available at:
https://www.instagram.com/teresacristinaoficial/
.
Access: 10 Jan. 2022.
10
Available at: https://www.instagram.com/hyldon.oficial/
.
Access: 10 Jan. 2022.
11
The experience lived by one of the authors of this article.
Access: 10 Jan. 2022.
image/svg+xml
Musical Lives: The strike of real time streaming during the Covid
-
19 pandemic
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e022019
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
10
reached a few hundred views after the live broadcast, ranging from two hundred to eight
hundred. Sometimes during his lives, Hyldon mentioned how this activity was good for his
men
tal health, a commitment he made to the public for which he took the time to prepare and
rehearse some musical numbers, including songs that were not his usual repertoire. At the same
time, keeping the idea of improvisation, the artist risked playing songs
requested on the spot by
the spectators without major concerns when he needed help remembering a chord or verse of
the lyrics.
The singer and songwriter Marília Mendonça performed her first live
12
performance on
April 8, 2020, in which she
performed her vocal performance live, as in a karaoke show, in
which the band's playback
13
is played in real
-
time for the artist to sing, sitting in an armchair
in the living room of her house. With the image transmission at the TV production level, with
c
amera cuts and many interactions between one set and another of songs, there was also the
appeal of mobilizing donations, through a QR Code displayed on the screen of the transmission,
for philanthropic purposes in exchange for the presentation performed f
or free by the artist and
offered to her loyal and captive audience.
“
National singers dominated the global ranking of
musical lives on YouTube, released by the platform. The featured artist is Marília Mendonça,
who took the lead with 3.31 million viewers
simultaneously
”
(WERNECK, 2020
, our
translation
).
The presence of the artist and the popularity of her compositions are what matters, after
all, the attachment of her loving (amateur) audience matters with her live performance,
regardless of whether the in
strumental performance of her band is recorded and reproduced as
a playback
.
The Welsh lyric singer Katherine Jenkins, who dedicates herself to the operatic
repertoire as well as to pop, has also performed lives using playback on her Facebook
14
profile.
Even at home, Jenkins performed a whole mise
-
en
-
scène and did not neglect her costumes,
always wearing long dresses. Considering the universe of classical music, in which there is still
resistance to technology, such as the electric/electronic am
plification of instruments, one can
see, in this case, the abandonment of this musical preciosity as a function of necessity. Some of
his lives have reached more than half a million views
.
12
Available at:
https://youtu.be/s
-
aScZtOfbM
.
Access: 10 Jan. 2022.
13
Pre
-
recorded musical background over which you can sing or play an instrument.
14
Available at
:
https://www.facebook.com/KJOfficial/live_videos
.
Access: 10 Jan. 2022.
image/svg+xml
Felipe Saldanha ODIER; Robert MOURA e Lúcia
CAMPOS
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e02201
9
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://
doi.org/
10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
11
Adriana Calcanhotto
made her first live performance through the SESC at Home
15
program that was broadcast on the institution's YouTube channel, in her house, in an
environment of black walls, with two crossed hammocks, one blue over the other red, sitting
on a stool playing
guitar. The sound is captured by a condenser microphone, which sends to the
audience the acoustic sound of the ambiance of the room where the artist performs. The care
with the image, in the expanded sense, is less concerned with the narcissistic dimension
of the
presence of her body in front of the camera but with the scene that is established by composing
a possible scenario with elements inhabited in her residence and that relate to her previous work
in progress until the beginning of the pandemic.
The f
irst live of Gilberto Gil and Family, São João em Araras Ao Vivo, was performed
in the backyard of his house, with the structure of a concert stage and with image capture,
editing, and transmission whose quality equals that of the production of one and tra
nsmitted on
his YouTube
16
channel. The event maintained the standard of a Gil concert, strictly artistic,
without many interruptions, in which music, performance, and sound mattered in the
foreground of the event. Gil's June live became an EP
17
distributed on all streaming music
listening platforms for its technical greatness of production and high level (mainstreaming) of
musical performance.
Known for his concerns with the technical quality of his shows and records, a fact that
led him from th
e 1970s to make his recordings in the United States of America (ARAÚJO,
2014, p. 62), Roberto Carlos also surrendered to lives. In the case of the artist, television
production also falls, and here literally, because the broadcast was made by Rede Globo, t
he
network with which the artist has an exclusive contract. The live performance on April 19,
2020
18
,
his 79th birthday, was held in his private studio Amigo, located in the Urca
neighborhood in Rio de Janeiro, which provided the sound quality of a profess
ional studio. A
differential within the singer's production was that he performed accompanied only by two
keyboards played by Tutuca Borba (musician in his band) and Eduardo Lages (conductor of his
band). Normally, the RC
-
9 (as Roberto Carlos' band is call
ed) counts on almost two dozen
musicians. The very reduced formation was a way to be careful with the restrictions imposed
15
Available at
: https://youtu.be/y_rSFDWnxiQ
.
Access: 10 Jan. 2022.
16
Available at:
https://youtu.be/s6KB4dDmrcw
.
Access: 10 Jan. 2022.
17
The acronym for extended play corresponded to t
he vinyl record, usually with four tracks, two on each side, and
that in Brazil became known as double compact in contrast to the single compact (or single, in English) that had
two tracks, one on each side. EP and single denominations became common in Bra
zil with the advent of digital
music platforms.
18
Available at
: https://www.youtube.com/watch?v=q5AI6p5id
-
I
.
Access: 10 Jan. 2022.
image/svg+xml
Musical Lives: The strike of real time streaming during the Covid
-
19 pandemic
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e022019
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
12
by the pandemic protocols. The singer performed a second life to celebrate Mother's Day. Once
again, the artist opted for a smaller f
ormation with only five musicians, Norival D'Angelo on
drums, Dárcio Ract on bass, Paulinho Ferreira on guitars, Tutuca Borba, and Eduardo Lages on
keyboards. It is worth noting that all the musicians wore masks and were separated from each
other by acryli
c plates. Singing without a mask, Roberto Carlos called attention to the fact that
the distance between the musicians was also being respected. Rede Globo broadcasted the first
45 minutes and in its entirety on the cable channel Multishow, the internet on
the Globoplay
website, and the artist's official YouTube channel
.
But not all these major productions surrendered to the television aesthetic. This was the
case of Jorge Drexler's concierto
by Live Stream, held on July 5, 2020
19
,
which took place as a
sequence shot in black and white, registering from the arrival of the artist from the studio
parking lot, who goes all the way through playing a matchbox and singing the first song of the
reper
toire, going backstage, revealing the crew and handing over his hat, and exchanging the
matchbox for a guitar, with which he proceeds to the microphone and finishes the song. The
musician greets the audience and performs his entire show (which was already
on tour before
the pandemic in solo format), relying on a performative structure composed of scenic elements,
stage movements, and lighting that create sophisticated ambiances and a compelling image but
fundamentally sonic experience with textures and arti
stic sound design. The presence of the
body in space and movement with the stage objects and the proposed intermediaries
20
on stage
as in the aspects of the
“
treatment of the voice
”
, according to Lívio Tragtenberg (1999), which
occurs from technical automa
tion that contributes to plastic qualities created by the expansion
of the live vocal presence:
Combined with amplification resources and processes such as alteration of
height (pitch change), timbre (alteration of harmonics, distortion,
compression, chor
us, flange, etc.), spatiality, duration, and ambiance (short,
medium or long reverberation, echo, delay, etc.), the voice on stage more than
ever is an object of elaboration of the stage composer" (TRAGTENBERG,
1999, p. 110
, our translation
).
19
Available at:
: https://www.youtube.com/watch?v=KnsFbj0Z
-
FI
.
Access: 10 Jan. 2022.
20
“
The term
“
intermedia
”
was introduced by Dick Higgins in the pioneering essay
“
Intermedia
”
in Something
Else Newsletter, v.1, n.1, 1966, later published in D. Higgins, Horizons: The Poetics and Theory of the Intermedia,
Carbondale: Southern Illinois University Press, 1984, p. 1
8
-
28. In that Essay, Higgins announced his conviction
that
“
much of the best work currently produced seems to fall between media
”
(p.18). His understanding of the
term became relevant to attempts to distinguish so
-
called intermedia from mixed
-
media and mul
timedia
configurations. Higgins uses
“
intermedia
”
to refer to works
“
in which the materials of several more established art
forms are 'conceptually fused' rather than simply juxtaposed
”
(E. Vos, The Eternal Network: Mail Art, Intermedia
Semiotics, Interart
s Studies, in U. B. Lagerroth, the Arts and Media, Amsterdam, Atlanta, Rodopi, 1997, p. 325);
the quality of media juxtaposition is attributed to so
-
called mix media and multimedia configurations.
(RAJEWSKY, 2012, p. 43
, our translation
).
image/svg+xml
Felipe Saldanha ODIER; Robert MOURA e Lúcia
CAMPOS
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e02201
9
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://
doi.org/
10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
13
Under this aspect, in the case of these mainstreaming productions, we have, as an
example, Drexler's live, in which we can identify scenic/performative aspects in which "The
spectator's attention is placed on the execution of the gesture, the creation of t
he form, the
dissolution of signs and their permanent reconstruction. An aesthetic of presence is established
(met en place)" (FÉRAL, 2008, p. 208
, our translation
). And in this strong sense of performance
when it is art, to answer John Dewey's (2010) ques
tion that thinks "art as experience" and
questions the aesthetic experience (when is it art?), in a societal and cultural time of banalization,
liquidity, and de complexification of things and events, it is always good to remember that there
is still art:
In short, different groups and subgroups have in common the knowledge of
the conventions in force in an artistic discipline and have acquired it in various
ways. For example, when circumstances permit or require it, those who share
this knowledge can act
in concert according to the modalities inherent in the
network of cooperation in question, and in this way, creating this art world (of
its internal division into different kinds of publics, the producers and the
individuals who constitute the support staf
f) is another way of talking about
the distribution of knowledge and its role in collective action (BECKER, 2010,
p. 79
, our translation
).
In this sense, the formation of Art Worlds is produced by what is taught using production,
diffusers of aesthetics, producers of tastes and likes, and attachments (HENNION, 2004). The
public is somehow induced (or taught) to like, bind and attach itself to
a certain type of
compulsory production, televised, with limited standards of behavior and ways of being. The
industry produces amateurs, but in coexistence with "worlds" that produce aesthetic experiences
in the strong sense, such as those of Jorge Drexl
er and Adriana Calcanhotto, who take care of
all aspects of the image, with the scene and behavior of the body in space, whether in the context
of the concert like Drexler's live, or the domestic environment as was the context of
Calcanhotto's live. The as
pect that can contribute to understanding how the behavior of the
public operates regarding the products and productions offered by the music scenes:
The practices of the amateurs studied vary in contrasting ways the basic
elements of taste, which the ana
lysis brings to light: the relationship with the
object, the support in a collective, the cultivation of oneself, in short, the
constitution of a technical device (understood in the broad sense as a more or
less organized set of conditions favorable to the
unfolding of the activity or
appreciation). Taste is neither the consequence (automatic or educated) of the
very objects tasted nor a pure social disposition projected onto the objects or
a simple pretext of a ritual and collective game, it is a reflexive
and
instrumentalized device that puts our productions to the test. It is not
image/svg+xml
Musical Lives: The strike of real time streaming during the Covid
-
19 pandemic
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e022019
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
14
mechanical, it is always
“
tentative
”
, it is an event (HENNION, 2004, p. 11
,
our translation
).
The sociability that crosses the liking and love of amateurs, in their attachments, is
implicated not only to the sound of music but to the
“
cooperation networks
”
(BECKER, 2010)
and fruition, which are formed based on the tasting of the artist as an object
, on the socialization
that is inscribed in the chats of live broadcasts, in the entertainment and in the production of
individual presence that contains the gesture of interaction and writing during the lives. There
are many possibilities for the tasting
of amateurs.
Possible Lives and the diversity of professional video productions in the Music Scene of
Belo Horizonte
To bring a cut of lives with low streaming artists, we based ourselves on artists from the
Belo Horizonte music scene (a city in
which the authors of this article live, being the same
observers and participants of this scene as musicians and researchers) who had experiences with
the format of lives
.
The Somos
Um (We Are One) project, by musician Cliver Honorato, was carried out as
an independent initiative since the creation of
“
cooperation networks
”
and the association of
the hybrid format of real
-
time streaming, performing duets with guests who sent their
pr
eviously recorded participations, to be played in real
-
time with Honorato's live performance,
playing the guitar and singing together with the guest artist. The transmission was carried out
with the support of a professional technician who captured the sou
nd of the ambiance of the
musician's apartment room through a tape recorder and sent it to the duets' return monitor,
which was listened to through a cell phone headset. Performed collaboratively with local,
interstate, and international artists and produc
ers, the
“
cooperation networks
”
created an
engagement that brought together several public niches and diverse audiences, also contributing
to Cliver Honorato's work scope and promotion since the broadcasting of Somos Um.
Donations were made by the public d
igitally, from reais to euros, and the whole team involved
was paid for sharing the money collected by the public during the virtual event. After the live
broadcast, live stayed on the artist's channel. However, its first edition
21
went off the air
because
it was selected in the Invitation to Occupy the Minas Gerais Vale Memorial, whose
video was hired and replayed in second hand in the institution's channel, remaining exclusively
21
Available at:
h
ttps://youtu.be/X_cdNYESl
-
M
. Access: 10 Jan. 2022.
image/svg+xml
Felipe Saldanha ODIER; Robert MOURA e Lúcia
CAMPOS
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e02201
9
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://
doi.org/
10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
15
as a publication of the same, that is, the hiring of a musical performance to
composing the
programming of the 2021 space became an institutional collection.
The show Temperado
22
by artist Mamutte
was performed in a site
-
specific through the
classification and contracting through the first call for proposals of occupation of the Minas
Gerais Vale Memorial in a virtual way, within the programming of the space that occurred in
the second half of 2020
. Through research on possible technologies to mitigate the sound
damage of transmitting the instrument and the voice concomitantly, a mixer
23
was used
,
inspired by the Roland model, a product sold out worldwide due to the pandemic
unprecedentedness and th
e demand for streaming presentations in real
-
time. Several
independent audio engineers developed the type of equipment used and sold in various models
as interfaces for cell phone streaming. Mamutte invests in art direction as the power of the
image on the
video graphics plane, setting the stage in his room with a composition of plant
pots in the space and stage lighting from his technical collection. Recorded song by song, which
was gathered in post
-
production and finalized by the contractor, the artist ta
kes to the flat screen
the game of the body in movement in front of the static camera in only one fixed plane. It
delivers sound quality captured by a line from the interface/mixer, considering the sound
dimension of the musical performance
.
The Federal U
niversity of Minas Gerais also continued its program of artistic events
through the UFMG #EmCasa Cultural Circuit, which repeated the same broadcasting formula
employed in the Minas Gerais Vale Memorial, that of a real
-
time exhibition of an audiovisual
rec
ord previously recorded and premiered on YouTube at a scheduled time and date, as
unprecedented performativity. Featured in the program, the singer Drag Queen Azzula
24
performs with musician André Resende in a video captured in fixed plan and audio that al
so
registers much of the ambiance of the space of the house where the performance takes place.
The “utopian body” and the belting
25
as the potency of the attachment please her audience by
imposing themselves over the sound and visual aspects of the space and the video in which she
performs. The artist ends up occupying an entertainment space when presenting himself
performing a perform
ance that also permeates, besides the tacit musical, the dimension of a
kind of entertainer, because, after all, that previously recorded video must offer the public a
freshness as if it were live, the sympathy, the emotion, the charisma, must (between)hav
e. The
22
Available at
:
https://youtu.be/8xp4tEx3pkE
. Access: 10 Jan. 2022.
23
Streaming interface for smartphone IS5 Gold Pro @ric_cortezgoldpro
.
24
Available at
:
https://youtu.be/9Vs6v9iBdQk
.
Access: 10 Jan. 2022.
25
Vocal adjustment is cataloged in the context of American pop and gospel music as a technique developed from
the aesthetics of the English language
.
image/svg+xml
Musical Lives: The strike of real time streaming during the Covid
-
19 pandemic
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e022019
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
16
actor who there embodies the image and form of Azzula is a voice professional who executes
with excellence and exuberance the punch belter of her singing but coexists with the coherence
of the figure and performative presence of the Drag Queen, whic
h is always associated with the
occupation of a symbolic and performative place of entertainment, which in this context is no
longer a specificity attributed to the artist in question. However, to any other who occupies the
presence of performing in "lives
" transmissions with streaming in time of simulacrum of the
real, after all, the production of presence should be the same (fictionalized) by the interactive
fantasy in the chats, by the audience, who should expect the same from the artist in his
performan
ce
.
The SESC Invitation Program, made possible by a national public notice, transmitted
Joana Bentes' Instante
26
concert using the same previously recorded recording procedure. This
strategy minimized the noise and connection breakdowns that real
-
time str
eamings, especially
small productions, are subject to. Performed on December 2, 2020, Bentes, a music producer,
visual artist, and lighting designer always takes care of the images of the scenes in which she
performs. The sound in her home Studio JOB was c
arefully captured and mixed by the artist,
who appears on screen in variations of planes and colors in the video editing. During the show,
the artist told the compositional history of each song presented and gave a special narrative tone
to her video show.
Final considerations
We can consider that part of the viewers who joined the lives, like the radio listeners
previously mentioned by Eco (1979, p. 316), wished to listen to music. But, we also had those
who considered the need for interaction through c
hats during their lives and even direct
interaction with the artist as a demand that emerged given the social isolation imposed by the
pandemic.
Different technical and aesthetic approaches were adopted by the musicians, according
to structural/economic possibilities or by personal choice in an attitude of artistic stripping, read
by force
-
form of performance for the flat screen. The experiences de
scribed also indicate that
the audience can give up a higher quality audiovisual as long as the musical production
(repertoire and musical performance) pleases them. According to Anthony Seeger (2008), the
music here listens more for what it plays as signa
ls of remembrance to the human heart than as
26
Available at
:
https://youtu.be/Ko8Dck4rlBE
. Access: 10 Jan. 2022.
image/svg+xml
Felipe Saldanha ODIER; Robert MOURA e Lúcia
CAMPOS
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e02201
9
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://
doi.org/
10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
17
a requirement of sound quality and or performance, for
“
[...] to understand the effects of music
on an audience it is necessary to understand how performances affect both performers and
audience. Indeed, music i
s more than physical [...]
”
(SEEGER, 2008, p. 244
, our translation
).
These are aspects of musical sociability that make
“
[...] retrace with listeners the 'customs,
reflections, and myriad circumstances' that endow music with its effects [...]
”
(SEEGER, 200
8,
p. 244
, our translation
).
In this case, it is necessary to consider both the musical perception of each person's
hearing and the different qualities of music reproduction equipment used by the listeners
throughout life, only sometimes of great
sound fidelity. For example, suppose one listens to
music with decadent diversities of sound qualities. In that case, the image has more strength
and even more marked presence in the epistolary affections registered in the chats in real
-
time
and eternalize
themselves registered in the video in the cloud.
The performance becomes content and an institution's collection for a derisory sum. The
rights to use images and sound are compulsory, and the excellence of the presentations takes
on an exhaustive dimensio
n in the search for a quality standard that surpasses the erratic reality
exposed to the unforeseen events and hesitations of real live art. The presentations become
contents, the shows become collections, the fees are increasingly reduced to absurdly low
values, and they are submitted to unacceptable (impossible) missions of feeding and funding a
whole productive chain that works in the service of the musical performance event in real
-
time.
REFERENCES
ARAÚJO, P. C.
O réu e o rei
:
Minha história com
Roberto Carlos, em detalhes. 1. ed. São
Paulo: Companhia das Letras, 2014.
BECKER, H. S.
Mundos da Arte
. Tradução: Luís San Payo. Lisboa: Livros Horizonte, 2010.
DEBORD, G.
A Sociedade do Espetáculo
. Tradução: Estela dos Santos Abreu. Rio de
Janeiro: Con
traponto, 1997.
ECO, U.
Apocalípticos e integrados
. 2. ed. São Paulo: Editora Perspectiva, 1979.
FÉRAL, J.
Por uma poética da performatividade: O teatro
performativo.
Revista Sala Preta
,
São Paulo, n. 8, p. 197
-
209, 2008.
Available at
:
https://www.revistas.usp.br/salapreta/article/view/57370.
Access
: 18
Sept
. 2022.
HENNION, A. Música e mediação:
Para uma nova Sociologia da Música.
Tradução:
Flavio
Barbeitas.
In
: CLAYTON, T.; HERBERT, R.
The Cultural Study of Music
: A Critical
Introduction.
London:
Routledge
, 2002.
image/svg+xml
Musical Lives: The strike of real time streaming during the Covid
-
19 pandemic
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e022019
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://doi.org/10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
18
HENNION, A.
Uma sociologia dos
attachements
:
De uma sociologia da cultura a uma
pragmática do gosto. Tradução: Lúcia Campos. 2004.
HENNION, A. Pragmática do Gosto
.
Desigualdade & Diversidade.
Revista de Ciências
Sociais da PUC
-
Rio
, Rio de Janeiro, n. 8, p. 253
-
277, jan./jul. 2011.
Available at
:
https://desigualdadediversidade.soc.puc
-
rio.br/media/artigo10_8.pdf.
Access
: 20
Feb
. 2021.
IZEL, A.
Teresa Cristina, rainha
das lives: ''O
que tem segurado a gente é a arte''.
Correio
Braziliense
, 2020.
Available at
: https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/diversao
-
e
-
arte/2020/07/25/interna_diversao_arte,875107/teresa
-
cristina
-
rainha
-
das
-
lives
-
o
-
que
-
tem
-
segurado
-
a
-
ge
nte
-
e
-
a
-
ar.shtml.
Access
: 03
Mar
. 2022.
LEBRECHT, N.
Maestros, obras
-
primas & loucura:
A vida secreta e a morte vergonhosa
da indústria da música clássica. Trad
ução:
Rafael Sando. Rio de Janeiro: Record, 2008.
LIMA, T.
A
Canção nas lives
: Mediações da música pop em tempos de pandemia.
TV
UFRB, 2020. 1 vídeo (61 min).
Available at
: https://youtu.be/x2eggmG1T9Q.
Access
: 03
Nov
. 2021.
NASCIMENTO, J. P. C.
Abordagens do pós
-
moderno em música:
A incredulidade nas
metanarrativas e o saber
musical contemporâneo.
São Paulo: Cultura Acadêmica, 2011.
RAJEWSKY, I. O.
Intermidialidade, intertextualidade e “remediação”:
Uma perspectiva
literária sobre a intermidialidade.
In
: DINIZ, T. F. N. (org.).
Intermidialidade e Estudos
Interartes:
Desafios
da arte contemporânea. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2012.
SEEGER, A. Etnografia da Música.
Cadernos de campo
, São Paulo, v. 17, n. 17, p. 237
-
260,
2008.
Available at
: https://www.revistas.usp.br/cadernosdecampo/article/view/47695.
Access
:
12
Aug
. 2022.
WERNECK, N. Retrospectiva 2020: Lives dominaram o ano, e Brasil é destaque mundial
.
UAI
, Belo Horizonte, 2020.
Available at
:
https://www.uai.com.br/app/noticia/musica/2020/12/22/noticias
-
musica,266318/retrospectiva
-
2020
-
lives
-
dominaram
-
o
-
ano
-
e
-
brasil
-
e
-
destaque
-
mundial.shtml.
Access
: 03
Mar
. 2022.
image/svg+xml
Felipe Saldanha ODIER; Robert MOURA e Lúcia
CAMPOS
Rev. Hipótese,
Bauru, v. 8,
esp. 1, e02201
9
, 2022.
e
-
ISSN: 2446
-
7154
DOI:
https://
doi.org/
10.47519/eiaerh.v8.2022.ID408
|
19
ABOUT THE AUTHORS
Felipe Saldanha ODIER
Minas Gerais State
University
(UEMG), Belo Horizonte
–
MG
–
Brasil.
Master’s degree of
Arts
.
Robert MOURA
Minas Gerais State University
(UEMG), Belo Horizonte
–
MG
–
Brasil.
Master’s degree of
Arts
.
Lúcia CAMPOS
Minas Gerais State University
(UEMG), Belo Horizonte
–
MG
–
Brasil. Professor.
Doctoral
degree in Ethnomusicology. École des Hautes Études en Sciences Sociales
.
Processing and publication by the Editora Ibero
-
Americana de Educação.
Reviewing,
formatting, standardization and translation.